sexta-feira, 21 de outubro de 2011

O Homem Sem Sombra



     Era para ser apenas mais uma sexta-feira. É um dia semrpe almejado, com uma áurea diferente. Antecede o final de semana e geralmente transpira bons fluidos. Mas, logo ao acordar, algo parecia não estar certo.

     Mantendo uma rotina, saiu da cama, passou pelo banheiro e foi preparar o café da manhã. A casa estava estranhamente silenciosa. Apenas os próprios passos ecoavam pelas paredes desbotadas pelo tempo e agora vazias. Apenas marcas de que algo esteve pendurado ali destonavam da opacidade dos cômodos. Algo doradouro um dia enfeitou aquele espaço.

     Serviu a primeira xícara de café quente. O aroma não era o mesmo. Muito menos o sabor. Parecia que faltava algo, mesmo tendo seguido todos os passos dos últimos cinco anos, sempre obtendo êxito no resultado final. O jeito foi terminar aquele gole e seguir com o dia. "Seguir com o dia?". Percebeu então que se passava das oito da manhã e que havia perdido uma sessão de treino. Fato incomum nos últimos meses. Sempre disciplinado, acordava cedo, ainda noite, mesmo com chuva, e cumpria a risca o que estava na planilha. "O que ocorrera?" pensou. Nem se lembrar. Na verdade seu corpo parecia pertencer a alguém sedentário, sem vida. Desmotivado, a passos curtos e lento, se deslocava pela casa buscando seguir uma rotina rumo a mais um dia de trabalho.

     Ao sair para pegar algo no varal, foi bombardeado pelas primeiras luzes do dia. Olhando ao seu redor, observou algo assustador. Ficou ali paralisado, perplexo, tentando compreender o que estava acontecendo. Se dava conta de que havia perdido sua sombra. Sua companheira, sempre presente, nos bons e maus momentos. Mesmo quando se encontrava sozinho, fraco, uma mísera faísca era capaz de lhe mostrar que não estava realmente só. Ela estaria ali, para o que fosse preciso. Estavam fadados a seguir juntos, por toda a eternidade. Então por que não conseguia mais vê-la? O que acontecera? Onde, na linha do tempo que antecedia o momento, perdera sua única companheira? Se viu incapaz de responder.

     Buscou a sombra, pois não conseguia encarar o fato de que estava, literalmente sozinho. Via sentido agora na agonia que sentiu ao ouvir todo aquele eco pela casa. Sabia o porque não ter mais prazer com o café, até então responsável por injetar a primeira dose de ânimo do dia. Todos os sensores de prazer estavam intimamente ligados àquela que sempre estava presente. Ele sabe que, talvez por tê-la de forma tão constante e presente, tenha passado a tratá-la apenas como uma mancha negra aos seus pés. Isso pode ter entristecido sua companheira e, cansada dessa omissão, buscou traçar outro rumo. Ele esquecera que, na verdade, ali, ao seu lado, estava seu reflexo no espelho, sua própria imagem, sua cara metade e que, sem ela, perderia sua própria identidade.

     É sempre da forma mais difícil que se aprende. Agora ele teria que conviver com a perda, com o vazio. Havia traçado, com as próprias pernas, tal caminho. Sozinho havia chegado àquele estágio. Agora arcaria com as consequencias de seus atos. Teria força? Só o tempo irá dizer. Vida que segue. Hora de voltar ao trabalho.

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