domingo, 1 de janeiro de 2012

Lavando a alma



     Acabou! Encerrada a contagem regressiva iniciada lá atrás, com 365 dias, onde cada um faz seu próprio controle e nos segundos finais, como se todos convergissem para o mesmo objetivo, os segundos finais são televisionados, todos contam juntos e, após zerar-se o cronômetro, quando o último grão de areia cai, uma queima de fogos reinicia a contagem.

     E 2011 foi um ano cheio de altos e baixos. Começou comigo flertando com o triathlon. Era apenas uma paquera, coisa pequena, mas foi ficando sério e, por fim, assumimos o relacionamento. Dedicação máxima aos treinos. No tempo que restava, eu trabalhava, comia e dormia. Assim fomos ao longo do ano.

     Mas nem só de bons momentos fez-se o ano. O segundo semestre foi "punk". Anseio por férias, planos não se consolidando, muita coisa acontecendo ao mesmo tempo... Não teve jeito. Como se assolado por um terremoto, o chão se abriu e aquilo que parecia firme, sólido, se partiu e sucumbiu ao momento. E, como após toda catástrofe, não adianta ficar choramingando pelos cantos. Levanta-se a cabeça e reconstrói-se tudo de novo, do zero, tijolo por tijolo.

    O problema é o peso de tal fardo. Não tem como, deixa marcas. E aí, em um ato desesperado, você clama para que seu cronômetro acelere um pouco, que a contagem seja mais rápida, que o ano acabe logo, pois, simbolicamente: Ano Novo, vida nova. Ir para praia, tomar um banho de mar, tirar as impurezas, mal pensamentos, tudo de ruim que possa estar acumulado. Não dessa vez.

     Acertado o Reveillon para a cidade de São Paulo, relevei meu preconceito com a prova e decidir correr (novamente) a São Silvestre. Por mais lotada que fosse, parecia uma forma interessante de colocar um ponto final em 2011. Estaria fazendo o que me mantém são: correndo! Sozinho e sem inscrição, parti para Paulista.

     Sem muita surpresa, ao subir a escadaria do metrô e entrar na Avenida, o mar de gente já estava formado. Mas, com uma proposta diferente dessa vez, sentia-me bem ali. Olhei para cima e, após um dia inteiro de chuva, a água não caía mais, mas as nuvens ainda permaneciam encobrindo todo o céu da cidade. Já pronto para largar, e em um sincronismo perfeito, o locutor deu início à prova junto com os primeiros pingos de chuva. A massa se deslocou como um bloco único. Ali não se tem muita opção. Se você quiser fazer tempo, treine mais e consiga uma vaga no pelotão da elite. Se cair na muvuca, esqueça!

      E assim fomos. A medida que a quilometragem aumentava, o volume pluviométrico também. Água e pessoas se confundiam rumo ao Pacaembu. Olhando de baixo, parecia uma enxurrada de gente. Sem espaço entre as cabeças, rumamos para o centro velho. Avenida Ipiranga, São João, Viaduto do Chá... A essa altura já chovia bem forte e, sem distinguir suor e gotas d'água, parecia ficar mais leve a cada passada, como se meus pesos estivessem se diluindo em meio àquele temporal.

     Bem a tempo, pois logo chegamos na respeitável Av. Brigadeiro, uma subida que tende ao infinito e que leva o atleta ao desgaste máximo em sua travessia. Não ali, nem naquela hora. Sem poupar muito, ritmo mantido e, pouco a pouco, fomos subindo e, como em uma miragem, viu-se a Paulista logo à frente. Agora era uma descida monstruosa e já estaríamos no Ibirapuera (ponto de chegada).

    Pareceu que até a chuva estava se poupando na subida, pois, ao começarmos a descida, não se enxergava quase nada adiante. Era muita água caindo, pernas cansadas, ladeira exigindo e a dúvida: tentar segurar o corpo e correr o risco de cair ou deixar descer solto e correr o risco de cair? Em, na dúvida, o que gastar menos tempo. Freio de mão solto ao longo de quase 2 quilômetros de descida. Esquerda, direita, esquerda de novo e pronto, metros finais.

     À direita a árvore de Natal do parque ainda imperava soberana, sem se deixar abater pela chuva, apenas nos observando. No chão a água já passava a linha do tornozelo. O pórtico de chegada se perdia em meio a um dilúvio. Lutando contra as corredeiras, já sem saber onde pisava, apertamos o ritmo e cruzamos a linha de chegada. 

     Não passava nada na cabeça. Sentia apenas que estava renovado. Acabara de ter uma hora e quatorze minutos de um delicioso banho de chuva, tempo e água suficiente para limpar a casa, remover as marcas e preparar o ambiente para o novo ano. Não foi a tradicional banho de mar, mas com certeza serviu para lavar a alma. Faxina feita, que venha 2012. Feliz Ano Novo!

     


    

Um comentário:

  1. A passagem por gyn foi tão rápida quanto a SS. Trocou o Bolshoi pela Carol... justo. Mas e aquele telefonema camarada?!

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