quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

Novos Tempos



     Houve um tempo em que as publicações eram quase que diárias. A mente fervilhava, a incidência de emoções, de ações, de experimentações era descomunal. Não se passava um dia sem que algo novo fosse vivênciado. Desde um treino mais intenso, que conflitua racional e emocional, até uma simples aquisição, como um par de tênis. Não importava, tudo era motivo para a crição de um post. Bons tempos...

     Mas esses passaram, a realidade é outra, muita coisa aconteceu, algumas boas, outras ruins, mas todas marcaram. O questionamento surge em meio a tanta inércia: "Por que?". Se faz necessário entender tal ausência, um tanto displicente até. Seria causa ou consequência? O trato com as palavras acabara, as fontes de inspiração secaram ou seria fruto de uma rotina de treinos? Os treinos continuam, sim, isso nem chega a ser questionável. Mas a planilha vem encabeçada por "Período: Transitório". Soa até irônico mediante os acontecimentos nos últimos dois meses. Mas, se tratando de treinamento, gera um certo desconforto tal termo. "Transição para onde? O que esperar?".

     Em um curto intervalo de tempo, duas experíências esportivas geraram uma auto análise. Se fazia necessária avaliar o havia sido feito até então, os resultados obtidos e o que estaria por vir. Terminar o Long Distance de Pirassununga permitiu-me entender que, tudo até então, fora para concluir aquela prova com êxito. Ponto final! Tinha feito um boa prova, mas nunca, naquele momento, seria capaz de dobrar todas as distâncias. Nada mais coerente. Vinte e quatro dias depois, 180 quilômetros de pedal e uma certeza: se precisasse correr até a outra esquina, por um copo d'água que fosse, morreria de sede. Ali, como mais de 6 horas em cima de uma bicicleta, não conseguia ver-me a calçar os tênis e partir para completar uma Maratona. Não que esse pedal estivesse programado. Feito de forma súbita, por motivos pessoais, por sorte não gerou lesões, mas me rendeu um puxão de orelha.

     Agora, com uma planilha tranquila, sem maiores desafios, a rotina delimita meus dias. Desmotivado? Não, jamais. Os treinos sem, em sua maioria, cumpridos à risca. Mas nada que inspire um bom texto, mais alguns minutos sentados em frente ao computador, apenas para compartilhá-los aqui. São feitos, bem feitos, e nada mais. Porém, pensando um pouco mais friamente, é como se estivesse no Purgatório. Mediante processo constante, paulatino e moroso, faz-se a preparação para, neste caso, o reino do Ironman.

     A verdade é que tudo isso mudará. O volume de treino aumentará, a intensidade então, dispensa prognósticos. Quando a calmaria acabar e concluirmos a tal transição, os treinos virão ferrenhos, exigirão o máximo de cada parte do corpo e mente esforço total. Farão com que os dias pareçam mais curtos, criando a sensação de que, mal terminada uma sessão de treino, outra já estará iniciada. O esforço será tão brutal que fará do Ironman apenas mais um treino pesado. E como saber tudo isso sem nunca ter participado de algo dessa dimensão? Profeticamente, Marcinho avisará que, "após a virada do ano, o pior viria e que março e abril seriam meus piores meses."

     Que não sejam estimulantes, que não gerem motivação para a escrita, ou mesmo a necessidade de conversar sobre ele. O certo é que o tal "Período Transitório" deve ser bem aproveitado. Tem um porque de estar ali e, quando a transição for dada por encerrada, talvez ficarão apenas as lembranças de quão tranquila era a vida em tal fase. Portanto, caso suma por um tempo, talvez não seja o caso de desistirem do blog. Faça um pausa, procurem algo complementar, pois, se a motivação da escrita deste que aqui vos escreve vem com as exigências do treinamento, o primeiro semestre de 2012 será bem produtivo.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Presente de grego



    Ano novo, vida nova. Para muito essa frase só faz sentido dia 1 de janeiro. Tem que ter queima de fogos, pular ondinhas, comer e beber de monte...Não comigo! Oportunidade melhor que meu aniversário não há. Mudou o número na casa das unidades, tem que repensar a vida, rever conceitos e ações. E, em um mês repleto de situações inesperadas, por que não comemorar meus 31 anos fazendo algo novo? 

     A idéia era simples: pedalar 180 quilômetros! Iria olhar para frente, sem me preocupar com o que ficasse para trás, aproveitando cada metro rodado, mas nunca almejando o retorno a ele, até que meu ciclocomputador marcasse 90 km. Mudaria de mão e voltaria para casa. Com isso, além de colocar minha cabeça no lugar, conheceria a distância que terei pela frente em maio. Parceiros? Nenhum. O Felipe animou fazer os primeiros 30 km, mas dali para frente estaria por conta própria. Muito tempo para pensar na vida!!!

     Saímos Às 7 horas da Unicamp. Rumamos em direção à rodovia de Mogi e, em menos de trinta minutos, estávamos rumando para Holambra. Zerei o ciclo, pois queria saber meu rendimento na estrada. Sem muita pressa, fomos ganhando a estrada e, como num piscar de olhos, chegamos à Holambra. Essa primeira parte passa muito rápido, pois o dia ainda amanhece, o calor não é tanto e o corpo ainda esbanja vigor. Tempo que não volta... O Felipe fez o retorno e eu segui em frente. Conhecia meu caminho pelos próximos 20 km. Daí para frente, sem referencial. Na verdade, não sabia nem para onde iria. Perfeito!

     Rodei, rodei e logo ultrapassei minha zona de conforto. Continuei pedalando e, de repente, avistei uma placa. Aguaí. Nunca ouvi falar! A distância correspondia ao quanto pretendia fazer. Segui. Porém, logo à frente, uma bifurcação surgiu. à esquerda Ribeirão Preto. Com certeza não era para lá que gostaria de rumar. Fiquei na direita mesmo e fui. A essa altura já estava com mais de 60 km rodados, ou seja, ainda tinha quase uma hora pela frente. Mas já não estava sozinho. O Sol, que pareceu ter acordado um pouco mais tarde hoje, desceu com tudo sobre mim. É, subimos o nível da brincadeira.

     Com 70 quilômetros a primeira placa na nova rota. Andradas. Pelo amor, isso eu sei onde fica: Minas Gerais. E o pior era que, pela distância, não ficaria muito longe do meu retorno. Iria romper o limite de São Paulo? Via que exagerara na dose. Já com pouca água e sofrendo para percorrer todas as pirambeiras oferecidas pela rodovia, clamava por uma visão, uma miragem, um posto que fosse. Não via-se postos na beira da estrada. Iria eu, em pleno aniversário, esturricar sozinho? E indo para Andradas? Jamais...

     Com 82 km de estrada e quase noventa total, apareceu, enfim, um posto. Apesar da precariedade do lugar, não tive dúvidas: entrei como se fosse o paraíso. Enchi minhas caramanholas, lavei o rosto, xixi de leve (mais de três horas sem urinar? Foi como um parto!) e, quase babando de tanto desejo, pedi uma coca gelada. Abri. O barulho soou como música aos meus ouvidos. Um gole demorado, gostoso. Desceu gelado, resfriando um corpo que há muito vinha sendo castigado pelo astro maior. Isso é trabalhar o psicológico! Voltei para estrada renovado. Hora de acabar minha "ida!"

     Mais alguns quilômetros e avistei que teria uma descia gigantesca, seguida de um morro. Claro que a descida gigantesca viraria-se contra mim e se tornaria um subida sem fim. Olhei com quantos quilômetros estava. 86,5km total. Já estava desgastado. Achei pertinente retornar ali, antes de descer. Não seriam 180 de estrada, mas rodaria um pouco mais no total.

     Apontando a bike em direção a Campinas, a cabeça trabalha de outra forma. Agora não espero mais pelo desconhecido. Teria que administrar meu retorno, dividindo minhas forças, já bem fragilizadas, até o ponto final. Eram 10:06 da manhã. Mais três horas e pronto.

     86 quilômetros longe de casa, cansado e com muito calor. Só pedia para não ter nenhum pneu furado. Já estava no nível hard, não precisava apelar! Minha água era jogada na cabeça e, as gotas que passavam pelo canto da boca eram, sorrateiramente, abduzidas. Assim combatia o calor e matava a sede!

     Quando atingi a marca dos 100 km, estava voltando para o rodovia de Mogi, meu território. Bom, dali já dava para ter uma noção de como chegaria em casa. E as previsões não eram muito animadoras. Via minha água acabar, as pernas já não rendiam tanto. Nem o recurso do clip, muuuuito boa aquisição diga-se de passagem, me faziam progredir de forma constante.Aproveitava os planos e as descidas para tirar o máximo clipado, pois sabia que nas subidas estava a me arrastar.

     Sem água, com 120 km rodados, avistei um posto da Polícia Rodoviária e não hesitei: atravessei a pista, encostei a bike e pedi por água. Devia estar com uma aparência horrível, pois o guarda rapidamente me mostrou o filtro e me deu passe livre. Coloquei o cantil e, ao sentir a água preencher o recipiente, notei uma queda de temperatura nas áreas de contato. Era uma água fresquinha, gelada... nossa, pensei em ficar por ali e pedir uma carona. Mas rapidamente me recompus, enchi as garrafas e parti. Estava muito próximo. Queria apenas passar pelo trevo de Holambra e estaria por menos de uma hora. E o trevo veio. Tinha 50 minutos para percorrer um pouco mais de 25 quilômetro. Nada é fácil quando já se tem 150 quilômetros piscando no visor.

     Mantive a estratégia: puxar na descida e conter nas subidas. Passou AMBEV, Red Eventos, Motorola e, enfim, o tão esperado pedágio. Agora era uma boa descida, uma pequena subida e minha entrada para o Guará. Já sem muito gás, passei pelo posto policial e avistei onde entraria. Não sabia por onde passaria no retorno, apenas que não teria o paredão do CPQD pela frente. Antes de virar, consultei o quanto havia rodado. Em exatamente 6 horas, tinha rodado170,12 km. Na hora vi que, em um percurso mais plano, faria os 180 km. Só não me via descendo da bike e partindo para correr uma Maratona. Ainda!

     Adentrei por estradas até então desconhecidas. Realmente estava afim de desbravar. Mas já não era mais tão engraçado. Queria saber por onde rodava, quanto faltava, se teria subidas e, por fim, quando acabaria. De nada adiantava meu querer. Tomava um rumo que, ao meu ver, parecia não estar muito correto. Pedi uma, duas informações e todas confirmavam aquele caminho. Então continuem e, após um looonga e tão esperada curva acentuada à esquerda, me vi direcionado. Sabia onde estava. Agora fazia sentido. Mais alguns quilômetros e pronto.

     Quase sem querer fiz minha última subida, minha última curva à direita, ancorei na casa do Jorge Coli (sim, ainda tinha marcado uma aula no retorno!!), entrei sem muito conversar, liguei uma ducha gelada (tão gelada quanto eu, normalmente, odiaria ter como opção) e fiquei ali, parado, deixando que meu corpo esfriasse. Tinha acabado. Melhor, tinha percorrido meus assustadores 180 quilômetros. Vivenciara as tão assombrosas "6 horas de pedal". Agradeci muito por não ter que correr. Aliás, por não ter nem que andar!!! Já eram quase 14 horas e tinha aproveitado boa parte do meu dia fazendo o que, ultimamente, me completa. Abdicara, momentaneamente, de dormir, comer tranqueiras, bebericar, para obter conhecimento. O que fazer nas dez horas que me restam? Ah, agora é preencher o tempo com uma boa tarde de sono, regada a muita tranqueira e uma cervejinha gelada de presente (vai, eu mereço?).

sábado, 3 de dezembro de 2011

Como manda o figurino

   
 Não havia como ser diferente: fim de tarde na beira da piscina, por do Sol de plano de fundo, muita gente bonita reunida, drink de abacaxi e colar havaiano para recepcionar quem ali chegava. Neste clima de luau, um a um, atletas e acompanhantes, iam chegando para o terceiro Duathlon Contra Relógio da Unicamp. Muita gente conhecida, velhos amigos, aproveitando o momento para colocar a conversa em dia e confraternizar com aqueles que há muito não se via.

     Mas não se pode esquecer do foco de tudo isso: a prova em si. Todos organizando suas zonas de transição, piscina liberada para o aquecimento, hora de soltar um pouquinho antes de fazer valer. Preferi não cair na água antes do tempo, pois ventava muito e não queria ficar a bater queixo nos próximos trinta minutos. Atletas reunidos para as últimas informações, balizamento (largada a cada 30 segundos) e, exatamente às 19:30 hs, o primeiro silvo foi ouvido. Começava ali a prova!

     Em 29º, ainda restava algum tempo antes de chegar minha vez. Preocupado com o ombro, recentemente lesionado e ainda muito dolorido, não sabia o que esperar. Era tudo ou nada, faria o de sempre e, uma vez fora d'água, estaria em casa.

     Liberado para sair, golfinhei algumas vezes e, quase que implorando para não luxar o ombro, comecei a nadar. "São só só 300 metros, não precisa derrubá-lo agora!". Quem dera fosse fácil assim. Mas senti que, talvez por conta da dose cavalar de anti inflamatório que havia ingerido ou por estar bem mesmo, conseguiria encaixar a braçada  e rodar sem problemas. Nadei bem, solto, nada como um ano de treino. Sem saber meu tempo ao certo, saí da piscina e corri para a transição. Show time!

     Me lembro do tempo que gastei ano passado amarrando o bendito tênis. Meu Deus... Ainda bem que conheci o tal do cadarço elástico! Em segundos estava calçado e partindo para pista. Ali sabia, não haveria fator limitador. Era tudo ou nada. Correr ao máximo, até que acabasse. Tinha uma meta: bater os 15:20 do ano passado. Seria fácil, pois estou bem mais condicionado, mas nem por isso levei menos à sério. Sem exitar, abri minha primeira volta.

     Corria leve, mesmo que ainda recuperando o fôlego da natação, encaixei um bom ritmo e marchei. Tinha dois referênciais: um competidor (Felipe), que havia largado duas posições atrás de mim e tem uma corrida sólida, e um monstro sagrado chamado Jonas. Esse eu só queria saber em qual volta seria ultrapassado. Dependendo de qual, estaria bem na prova!!

     Completei a primeira volta e avistei o Felipe. Estava 200 metros atrás. Era isso, deveria "cozinhá-lo" ali. Se o perdesse daquele referencial, estaria abaixo do pace. E assim fomos. Duas voltas, tês, até que, após abrir a quarta volta, começo a ouvir um barulho ritmado. Soava como um relógio, constante, espaçado. Tic, tac, tic, tac... Não tive dúvidas, gritei: "Bora Jonas!!". Ainda bem que encurtei a frase, pois se tivesse tentado falar da forma correta, não teria completado à tempo. O rapaz passou com se aqueles fosse os últimos 2000 metros de sua vida. Restou a mim seguir se rastro.

     Fechei a quarta volta, puxei o que deu na quinta e última, abri para sair da pista e rumar para o pórtico de chegada. E aí, como que se alguém me estendesse um doce e se afastasse de mim tentando-me, avistei o outro Felipe. Parceiro de treino e a pessoa que vai passar mais tempo comigo no meu aniversário (amanhã tem um pedal gigante ao invés de bolo!!), estava começando a subir a rampa. Foi como se tivesse acabado de sair para correr. Mirei na nuca dele e parti! A essa altura até o Jonas ficaria orgulhoso! Corri, corri, corri e consegui sair na foto!! Passamos juntos a linha de chegada (Sim Felipe, o pórtico era um pouquinho mais para frente!!!). Já noite, acabara a prova. Coco gelado, alguns "parabéns" e hora de aguardar o resultado final.

     Premiação só geral. Ali não tem essa de categoria. Ganhou, ganhou de todos! Não almejava ficar entre os cinco. Tranquilo! Chamaram as meninas, os homens. O vencedor mandou um 12 alto de tempo. O resto por volta de 13 minutos. Encerraram a cerimônia e liberaram o tempo de todos no mural.

     Como estou sem relógio (falecido em Pirassununga), não tinha a menor idéia de quanto tinha feito. Corri para dar uma conferida. O Jonas, quinto geral, tinha feito 13'42". Dois rapazes, empatados em 6º, 13'43". /e depois, com 13'59", o Felipe (o mesmo que usei como referencial) e eu dividíamos a 7ª posição. Esperava um 14 baixo, mas 13 minutos jamais. Bom demais!

     Parece que, aos 48 minutos do segundo tempo, as coisas começam a dar certo novamente. Seria o fim do tal "inferno astral" ou apenas colhendo os frutos de um ano de trabalho? Isso as outras situações da vida me dirão. Por hora, fechamos o primeiro ano de envolvimento com esse esporte maravilhoso, que entorpece e faz querer cada vez mais, com chave de ouro. Agora é voltar o foco para ele, sim, aquele que me aguarda, que acena para mim lááááá na frente, com um sorriso sarcástico, como se soubesse o que me espera. E ele sabe. Não é à toa que o chamam de Ironman.