sábado, 30 de junho de 2012

Flor de cerejeira


   Era pra ser apenas uma visita, uma despedida formal, um último abraço nos bons amigos. Em meio à confraternização, uma pessoa mais que especial falou-me sobre o novo projeto: tatuar uma ramo de cerejeira na lateral do torso. O que era para ser um "que legal!", acabou despertando conhecimentos da cultura oriental a muito adormecidos, levantando algumas questões e me levando a refletir sobre o momento vivido.

   Acabei não tendo a oportunidade de perguntar o porque da tatuagem. Até hoje. Acabamos nos encontrando para jantar e, enfim, questionei-a. Ela demonstrou total conhecimento na representação da feminilidade na flor de cerejeira, sua beleza e fragilidade. Estava claro toda a lenda relacionada à flor e a pessoa da princesa Sakuya, mas busquei abordar o outro lado da lenda: a devoção dos samurais. O que levava guerreiros cegamente fiéis a veneram uma flor?

     Simples: sua efemeridade. Passava-se 362 dias de espera para ter apenas três dias de beleza e esplendor. Nada representaria melhor a fragilidade da vida e a necessidade de se viver o momento. Relacionavam suas próprias vidas às das cerejeiras. Sabiam que, a qualquer momento, poderiam cair diante de um inimigo. Desenvolveram a capacidade de admirar o momento sem projeções futuras.

      Longe de ser um samurai, mas meio que flertei com a morte ultimamente. Sofri um acidente feio, com perdas materiais, mas sem consequências graves. "Tem-se um flash back de todo o passado?" Não eu! Tive sim a oportunidade de reavaliar conceitos, crenças e costumes. Caminhar pela linha tênue que separa o presente e o passado me fez sentir saudades, ter desejos, querer mais. Pude desejar rever pessoas queridas, sentir falta de velhos amigos, querer voltar no tempo, buscar mudar, viver melhor. Vi, de forma contundente, a importância de viver um dia de cada vez, mas intensamente. "Só por hoje", certo? Temi partir sem fazer aquela viagem, sem comer aquele alfajor, sem dizer "eu te amo" àquela pessoa. Me vi deixando muito por fazer, pessoas por amar e por que? Simples comodismo. 

    Por isso voltei à Campinas. Sinistro, justamente no dia da minha volta, alguém que (desculpe o clichê) guardo do lado esquerdo do peito, estar prestes a tatuar algo tão grandioso, profundo, expressivo e, ao mesmo tempo, delicado.Talvez por isso esteja relacionado à pessoa de uma mulher, por isso que tenha feito guerreiros venerar sua existência. Talvez por isso divida com a bandeira nacional a importância para a nação japonesa. Talvez por isso alguém tão bela e única esteja prestes a marcar o corpo com tal imagem. Talvez, por isso, não seja uma má ideia "pegar carona nessa cauda de cometa"  e fazer um ramo de cerejeira.